Um estreante na Fórmula 1 deve passar por diversas provações para alcançar um lugar ao sol. No GP da Hungria de 1988, disputado em 7 de agosto daquele ano, em Hungaroring, o Astro-Rei brilhou demais para Mauricio Gugelmin (March). O calor foi intenso, a ponto de fazer o brasileiro perder mais de 2 quilos durante a corrida. Tudo isso por conta de um problema no sistema para hidratação do piloto. Além disso, o calouro superou um vazamento em seu bólido antes da largada e uma falha na embreagem para conquistar um convincente quinto lugar na etapa húngara, a 10ª do Mundial. Cansado e exaurido, mas satisfeito com seu segundo top 5 na Fórmula 1, o catarinense cumpriu com seu dever, matando sua sede de pontos depois de quase 2 horas de prova.
Os dois pontos obtidos em Hungaroring coroavam um regular início de carreira para Gugelmin. Com o quinto lugar na Hungria, o brasileiro contava com 5 pontos na classificação do Mundial, dividindo a 10ª posição do campeonato com Jonathan Palmer (Tyrrell). Isso após um começo de ano complicado, em que abandonou cinco dos seis primeiros GPs. Depois do retorno do ‘circo’ à Europa, os resultados passaram a aparecer para Mauricio. Nos GPs da França, Inglaterra e Alemanha, o catarinense terminou no top 8, com destaque para o quarto lugar em Silverstone, onde obteve seus três primeiros pontos.
A boa campanha colocava Gugelmin um ponto à frente do experimentado Ivan Capelli, seu companheiro na March. Graças à dupla ítalo-brasileira, a escuderia britânica figurava numa destacada 6ª colocação no Mundial de Construtores, com 9 pontos, à frente de times tradicionais, como Williams e Tyrrell. Para Hungaroring, a intenção era manter a fase promissora na perna do verão europeu. Pelas características do circuito – travado e de baixa velocidade -, o cenário era perfeito para a March, cujo modelo 881, desenhado por um pródigo Adrian Newey e impulsionado pelo motor aspirado Judd, parecia se encaixar à pista. Todavia, a etapa húngara seria um desafio e tanto para Mauricio e Ivan.
A começar pela sexta-feira, primeiro dia de treinos para o GP da Hungria. Quando os pilotos foram para a pista participar das primeiras atividades do fim de semana, uma chuva torrencial atrapalhou os planos das equipes. Pior para Gugelmin, que não conseguiu acertar seu bólido para a primeira sessão oficial, ficando com um tímido 21º tempo, com 1m35s237, bem atrás de Capelli, 11º com 1m32s675. O melhor tempo do dia foi de Alain Prost (McLaren), com 1m29s589 – 5s648 à frente de Mauricio, que colocou a culpa pelo mau desempenho na pista molhada do treino da manhã.
Porém, o brasileiro estava confiante para o sábado. Ainda mais porque a previsão do tempo era de calor em Hungaroring. Com o sol brilhando durante o treino oficial decisivo, Gugelmin se sentiu mais à vontade, o que trouxe boas marcas. No fim, anotou o tempo de 1m29s099, assegurando o oitavo lugar no grid. Entretanto, Capelli novamente foi superior, fazendo 1m28s350 e ficando com a quarta posição. A pole ficou com Ayrton Senna (McLaren), com 1m27s635, 1s464 mais veloz que Mauricio.
A corrida
O otimismo de sábado transformou-se em drama no domingo. Segundo a edição 949-A da Revista Grid, de agosto de 1988, pouco antes da largada, foi constatado um vazamento no tanque de combustível do March de Gugelmin. O problema causou alvoroço nos boxes da equipe, uma vez que não havia tempo para troca do carro. Na base da pressa, os mecânicos do time azul repararam o defeito e mandaram Mauricio para a pista. Não se sabia se o conserto havia surtido efeito quando a luz verde foi acionada em Hungaroring, dando início ao GP da Hungria. O brasileiro não largou bem, sendo superado por Gerhard Berger (Ferrari). Em contrapartida, Alain Prost (McLaren), que alinhou em 7º, pulou mal, despencando para o nono lugar.
Na volta 2, Capelli, o sétimo, começou a ter problemas com o motor Judd e caiu para o fim do pelotão. Na mesma passagem, Prost aproveitou-se da potência do propulsor Honda para superar Gugelmin. Dessa forma, prosseguiu na oitava posição. E ali permaneceu até a volta 23, quando Alessandro Nannini (Benetton), com problemas de superaquecimento, se viu obrigado a deixar a corrida. Com isso, Mauricio assumiu o sétimo lugar. Porém, de acordo com a edição de 8 de agosto de 1988 da Folha de S. Paulo, naquele momento, o brasileiro já sofria com problemas de embreagem. Também já estava sem a solução hidratante, que os pilotos costumam beber durante a corrida.
As dificuldades não tiraram o ânimo de Gugelmin. Pelo contrário. Na volta 39, Nigel Mansell (Williams) foi aos boxes, retornando à pista logo atrás do brasileiro. Assim, o estreante ingressava na zona de pontuação da corrida. Cinco voltas depois, após muita luta, Nigel superou Mauricio, derrubando o piloto da March para a sétima colocação. Na volta 49, com a parada de Riccardo Patrese (Williams), o catarinense recuperou o sexto lugar. Naquele momento, Mansell já andava no limite físico. Com febre, em decorrência de ter contraído sarampo do filho, o inglês sucumbia ao calor. Aos poucos, os tempos do britânico despencaram. O brasileiro da March se aproveitou disso para colar no inglês da Williams.
Na volta 59, Gugelmin deu o troco em Mansell, assumindo a quinta posição. Na passagem seguinte, Nigel foi aos boxes. Na volta 61, o inglês da Williams entregou os pontos – extremamente cansado, abandonou a corrida. A partir daí, Mauricio precisou administrar os ímpetos de Patrese. Apesar de, segundo matéria da Folha de S. Paulo à época, “controlar as trocas de marcha ‘no ouvido’ – sem usar a embreagem”, o brasileiro carregou seu March até a bandeira quadriculada. A vitória ficou com Senna, após triunfar num eletrizante duelo contra Prost – que ficou em segundo. Thierry Boutsen (Benetton) completou o pódio, seguido por Berger, Gugelmin e Patrese.
Por conta da excelência da disputa entre Ayrton e Alain, os demais foram relegados à segundo plano. Poucos deram atenção à luta de Mauricio, que chegou aos boxes desidratado, tendo perdido mais de 2 quilos durante a corrida. Mais magro, contudo, com 2 pontos na tabela de classificação. Mesmo diante de todos os obstáculos, Gugelmin superou as provações de Hungaroring.