EUA Leste-1982: Cheever surpreende e é segundo em Detroit

Eddie Cheever, entre John Watson (à esq.) e Didier Pironi (à dir.): segundo lugar em Detroit foi o auge da carreira

Eddie Cheever, entre John Watson (à esq.) e Didier Pironi (à dir.): auge da carreira veio em casa

Edward McKay Cheever Junior, ou simplesmente Eddie Cheever, atingiu o auge na Fórmula 1 em 6 de junho de 1982. Naquele domingo, o circuito de rua de Detroit, no Michigan, recebia pela primeira vez uma etapa da categoria máxima do automobilismo. Em plena capital norte-americana do automóvel, o estadunidense de 24 anos levantou o público que lotava as arquibancadas com um carro francês. A bordo de um Ligier, conquistou um expressivo segundo lugar no GP dos Estados Unidos-Leste de 1982. Foi superado apenas por John Watson (McLaren). Na pista, ultrapassou e segurou Didier Pironi (Ferrari), para garantir seu melhor resultado na carreira.

Quando desembarcou em Detroit, Cheever era visto como a grande (e única) esperança ianque na F1. Mas não a ponto de subir ao pódio diante de seus compatriotas. Substituto natural de Mario Andretti para os torcedores locais, Eddie nasceu em Phoenix, no Arizona, em 10 de janeiro de 1958. Ainda criança, passou a viver na Itália. Foi em solo italiano que a paixão pelo automobilismo arrebatou o garoto. Aos 8 anos, foi levado pelo pai a uma prova em Monza. A partir dali, a velocidade passou a fazer parte da vida do pequeno Cheever. Aos 15 anos, tornou-se campeão italiano e europeu de kart. Depois, disputou o campeonato da Fórmula 3 Italiana, mas não obteve sucesso.

Eddie trilhou carreira na Itália. Sua trajetória na F1 teve início em 1978, em Kyalami, pela Hesketh

A carreira de Eddie na F1 teve início em 1978, em Kyalami, pela Hesketh

Em 1976, ingressou na Fórmula 2, categoria de acesso à F1, pela Project Four. A equipe era liderada por Ron Dennis (sim, o futuro chefão da McLaren), e ofereceu a Eddie o suporte necessário para desenvolver sua carreira. Em 1977, com apenas 19 anos, alcançou o vice-campeonato, sendo superado apenas por René Arnoux. Diante do bom desempenho na F2, passou a ser pretendido por times da Fórmula 1. Em 1978, se arriscou pela Theodore nos GPs do Brasil, em Interlagos, e da Argentina, em Buenos Aires, mas não obteve classificação. Na etapa seguinte, na África do Sul, estreou pela Hesketh, mas sua prova durou apenas oito voltas – o motor Ford lhe traiu, obrigando-o a abandonar.

A apresentação em Kyalami-1978 foi a derradeira da Hesketh numa corrida de F1. E, por muito tempo, foi a única prova de Eddie na categoria. Isso porque não encontrou mais vagas disponíveis. Sem opção, o norte-americano retornou à Fórmula 2, ficando na categoria de acesso por mais duas temporadas. Em ambas, obteve o quarto lugar no campeonato. Ao fim de 1979, havia conquistado cinco vitórias, e a experiência necessária para ascender definitivamente à Fórmula 1. Em 1980, a Osella, time de Cheever no ano anterior na F2, decidiu estrear na categoria máxima do automobilismo, e levou o norte-americano para o projeto. Foi um tremendo fiasco: Eddie só completou uma prova – foi 12º no GP da Itália, em Imola -, abandonou nove GPs e não se classificou para quatro etapas.

Depois de uma boa temporada pela Tyrrell, em 1981, Cheever se transferiu para a Ligier no ano seguinte

Depois de uma boa temporada pela Tyrrell, em 1981, Cheever se transferiu para a Ligier no ano seguinte

Insatisfeito, Cheever se transferiu para a Tyrrell, onde disputou a temporada de 1981. Numa equipe estruturada, pôde mostrar seu potencial. Obteve cinco top 10, com destaque para o 4º lugar no GP da Inglaterra, em Silverstone. Com 10 pontos, foi superior ao seu companheiro de equipe, o novato Michele Alboreto – o italiano não pontuou na temporada. O bom momento fez Eddie ganhar um convite para defender a Ligier em 1982, para o lugar de Patrick Tambay. A diferença foi que, ao invés de dividir o time com um calouro, como Alboreto, estaria ao lado do veterano Jacques Laffite.

Nas três primeiras provas de 1982, Cheever e Laffite não viram a bandeira quadriculada. Na quarta etapa, o GP da Bélgica, em Zolder, Eddie levou a Ligier ao quarto lugar. Contudo, a desclassificação de Niki Lauda (McLaren) elevou o norte-americano ao terceiro posto. Na etapa seguinte, em Mônaco, a dupla da escuderia francesa voltou a abandonar. Sob desconfiança e com os quatro pontos obtidos em Zolder, o norte-americano da Ligier chegou a Detroit, palco do sexto GP do ano. Porém, muitas dificuldades foram encontradas no circuito norte-americano. O treino de reconhecimento da pista, agendado para quinta-feira, foi cancelado por problemas na colocação dos guard rails. Já a sessão oficial de sexta-feira acabou sendo adiada para sábado.

A chuva que caiu sábado, em Detroit, transformou a sessão oficial em loteria: Cheever ficou em nono no grid

A chuva que caiu sábado, em Detroit, transformou a sessão oficial em loteria: Cheever ficou em nono no grid

O fato de os pilotos não terem conhecimento do traçado de Detroit beneficiou Cheever. Além disso, a chuva que caiu sobre a cidade no sábado fez os treinos se tornarem verdadeiras loterias. A ponto de Nelson Piquet (Brabham), campeão em 1981, não conseguir classificação para a prova. Eddie carregou seu Ligier para o nono lugar, com 1m50s520, contra 1m51s270 de Jacques, 13º no grid. A pole ficou com Alain Prost (Renault), com 1m48s537, 1s983 mais veloz que o norte-americano.

Acidente na volta 6 entre Roberto Guerrero (Ensign) e Elio de Angelis (Lotus) interrompeu o GP dos EUA-Leste na volta 6

Acidente entre Roberto Guerrero (Ensign) e Elio de Angelis (Lotus) interrompeu a etapa na volta 6

A corrida

Diante da calamidade deflagrada durante o fim de semana, tudo poderia acontecer no GP dos Estados Unidos-Leste. Mas prever um pódio para Cheever parecia um pouco demais. Eddie confiava que poderia pontuar, caso a Ligier resistisse ao calor que assolava Detroit no domingo, dia da corrida. Na largada, o norte-americano ignorou a alta temperatura e superou Elio de Angelis (Lotus) e Manfred Winkelhock (ATS), assumindo o sétimo lugar ainda na volta 1. Duas voltas depois, Andrea de Cesaris (Alfa Romeo), então segundo colocado, abandonou a corrida com problemas de transmissão. Dessa forma, logo na volta 3, Cheever já figurava na zona de pontuação.

Na volta 6, um acidente envolvendo De Angelis e Roberto Guerrero (Ensign) interrompeu a prova. Na tentativa de ultrapassar o colombiano na Curva 1, o italiano da Lotus acabou colidindo com o adversário. Elio seguiu seu caminho, mas Guerrero ficou parado na proteção de pneus. Na sequência, Riccardo Patrese (Brabham) bateu na mesma curva. Diante dos ocorridos, a direção da corrida acenou com a bandeira vermelha, paralisando a etapa por quase uma hora. Na relargada, Eddie se aproveitou de um vacilo de Nigel Mansell (Lotus) e ascendeu para a quinta posição. A partir daí, o norte-americano da Ligier iniciou perseguição a Bruno Giacomelli (Alfa Romeo) que, por sua vez, andava no ritmo de Didier Pironi (Ferrari).

Eddie aplica volta em Marc Surer (Arrows)

Eddie aplica volta em Marc Surer (Arrows): 2º lugar foi obtido após atitude na ultrapassagem sobre Pironi

Na volta 26, Cheever superou Giacomelli para assumir a quarta colocação, trazendo Niki Lauda (McLaren) com ele. Duas voltas depois, Prost, com problemas eletrônicos em seu Renault, foi para os boxes, fazendo com que Eddie alcançasse o terceiro lugar. Naquele momento, Keke Rosberg (Williams) liderava, seguido por Pironi, Cheever, Lauda, Giacomelli e John Watson (McLaren), que fazia uma bela prova de recuperação, após largar em 17º. Na volta 29, Watson fez sua primeira vítima no pelotão: Bruno. Na ânsia de dar o troco no norte-irlandês da McLaren, o italiano da Alfa Romeo parou no guard rail na volta 30.

Com Giacomelli fora de combate, os problemas do estadunidense da Ligier passaram a ser a pressão da dupla da McLaren e o ritmo lento de Pironi. Em tarde inspirada, Watson não tomou conhecimento de Niki, Eddie e Didier, ultrapassando o trio numa mesma volta, a 33, para assumir o segundo lugar. Em quarto, e sem conseguir passar o francês da Ferrari, Cheever acabou sendo presa fácil para Lauda, que superou o norte-americano na volta 35. Depois de perder posições para os pilotos da McLaren, Eddie, enfim, tomou atitude e ultrapassou Pironi na volta 37.

Depois do acidente de Lauda, o norte-americano da Ligier superou Rosberg e assegurou o pódio

Depois do acidente de Lauda, na volta 40, o norte-americano da Ligier superou Rosberg e assegurou o pódio

Naquele momento, Cheever passava a acompanhar a luta da dupla da McLaren para tirar Rosberg da primeira posição. Com problemas de câmbio em seu Williams, Keke não ofereceu resistência e perdeu a ponta para Watson ainda na volta 37. Na sequência, veio Lauda. Todavia, na tentativa de passar o finlandês, na volta 40, o austríaco acabou se chocando no guard rail, deixando a prova. Na mesma passagem, Eddie se aproximou de Rosberg e superou o piloto da Williams, assumindo o segundo lugar.

Consolidado na prova, Cheever não tinha como alcançar Watson, líder destacado em Detroit. Com isso, passou a administrar sua colocação. Inicialmente, sua principal ameaça foi seu companheiro de equipe, Jacques Lafitte (Ligier). Todavia, o francês encarou problemas em seu bólido, perdendo o quarto lugar para Pironi, que se arrastava na pista. A bandeirada veio no limite das 2 horas de corrida, com uma vitória espetacular de John Watson, e com a festa de Eddie. Afinal, em casa, celebrava seu primeiro pódio de fato na carreira – em Zolder-1982, ficou em terceiro após a desclassificação de Lauda e não participou da cerimônia.

Segundo lugar em Detroit-1982 abriu portas para Eddie Cheever defender a Renault em 1983

Segundo lugar em Detroit-1982 abriu portas para Eddie Cheever defender a Renault em 1983

Depois dessa apresentação, Cheever alavancou sua carreira, a ponto de chamar atenção da Renault para a temporada seguinte. Contudo, seria ofuscado no time francês por um certo Alain Prost, o que acabou minando sua trajetória na F1. Em 1989, Eddie se retirou do circo após 132 corridas – sem nunca ter superado o feito de Detroit-1982…

Sobre contosdaf1

Desde 1981, um amante de automobilismo. E veio desde o registro, quando no cartório seu pai foi questionado se queria colocar o nome "Willians" no garoto. "Esse é o nome de uma escuderia. Pode dar problema para ele no futuro", disse a escrivã. Hoje em dia, a equipe Williams voltou a se destacar, enquanto o menino segue o destino. Jornalista, nascido em Santos, cobriu os GPs do Brasil de 2005 a 2009 em Interlagos pelo jornal A Tribuna. Acompanha a Fórmula 1 religiosamente desde 1986. Pretende fazer isso até seus últimos dias. Afinal, o faz desde o primeiro.
Esta entrada foi publicada em Alfa Romeo, Andrea de Cesaris, ATS, Bruno Giacomelli, Detroit, Didier Pironi, Eddie Cheever, Ensign, Estados Unidos, Hesketh, Jacques Lafitte, Ligier, Manfred Winkelhock, Roberto Guerrero. ligação permanente.

3 respostas a EUA Leste-1982: Cheever surpreende e é segundo em Detroit

  1. Paulo diz:

    Primeiramente parabéns pelo blog! E aproveitando pra comentar.. Essa foi a primeira corrida que lembro de ter visto, com meus 8 anos! Quem ganhou minha torcida eterna de menino na época foram Lauda e Prost!

  2. junior diz:

    Oi gente, muito legal esse site gostei muito das postagens e vou acompanhar mais. Grande abraço

  3. Bruno diz:

    Gostei do artigo por lembrar um grande desempenho, ainda que não resultante em vitória, e por parte de um piloto que também não chegou a vencer na Fórmula 1. Sempre fui admirador de Eddie Cheever, por sua pilotagem rápida e limpa, tendo sido daqueles pilotos que raramente erravam ou provocavam acidentes. Como disse o articulista, em 1983 terminou ofuscado na Renault por Prost, embora tenha feito uma temporada correta, mas sem maior brilho (não venceu corrida, nem marcou pole-position). Seus pontos altos foram o segundo lugar no Canadá e a extraordinária largada em Zandvoort, talvez a mais bela que já vi na Fórmula 1(quem quiser conferir, o Youtube esta aí para provar). A partir daí guiou sempre para equipes médias (Alfa-Romeo, Lola-Beatrice e Arrrows), onde ainda realizou algumas belas atuações: o 4o lugar no grid de Mônaco em 1985 (com Alfa Romeo) e os 3o lugares em Monza 1988 e Phoenix 1989 (Com Arrows). Em 1989, recebeu o convite para ser piloto de testes da Benetton (com chances de eventual titularidade caso o convalescente Johnny Herbert não conseguisse se recuperar do brutal acidente sofrido na Fórmula 3.000). Cheever achou mais seguro renovar com a Arrows e perdeu o que seria a grande chance de sua carreira, pois o inglês não conseguiu completar a temporada por conta de seus problemas físicos e acabou substituído pelo apagado Emanuele Pirro. De qualquer forma, o 2o. lugar em Detroit fica, de fato,como seu melhor desempenho na Fórmula 1. Por isso, parabéns pelo artigo e pela lembrança. Viva Eddie Cheever!

Deixe uma resposta para junior Cancelar resposta